Eu cresci num lar separado pelo sangue de minha mãe e meu pai,
várias vezes entrei no meio de socos e pontapés para separa-los.
Quando meu pai separou-se da minha mãe, eu lembro de como eu chorava,
nas madrugadas sozinho sentindo falta do homem que me educou.
Minha mãe viveu numa frustração sem fim, descontando toda revolta nos seus filhos e na sua vida.
Não adiantou, meu pai foi mesmo embora de casa.
Meu pai se foi, mas nunca nos deixou de verdade, estava sempre lá nas várias idas e vindas,
nunca abandonou o lar por seus filhos e talvez eu realmente acredite no que ele disse:
"Sua mãe é a mulher que eu mais amei na vida, mas é impossível conviver com ela."
Meu pai tinha uma síndrome, adorava mulher, antes de morrer me disse que não podia ficar uma noite sem sexo.
Eu, não sei se é errado dizer isso, mas Graças a Deus não herdei esse desejo dele.
Acredito que um relacionamento baseado apenas em sexo está fadado a morrer mais cedo ou mais tarde, mesmo depois que inventaram a "azulzinha", o sentimento tem que permanecer para que a união seja total.
Pois é, meu pai faleceu, faz 13 anos, não deixou nenhuma herança, nem muitos bens, mas deixou o maior bem de todos, ensinou aos filhos a serem honestos e educados, alguns momentos ainda na minha infância guardo na minha consciência, lições que meu pai fazia questão de nos ensinar desde meninos para aprendermos cedo o respeito pelo bem.
Eu ainda era muito criança quando em Belo Horizonte meus tios me mandaram ir numa padaria comprar pão, presunto e queijo, eu fui com meus primos, lá no alto do Bairro Floresta, pegamos os produtos e entramos na fila enorme, talvez na maldade ou na falta de paciência em esperar, decidi levar os produtos sem pagar, e não me lembro como, meu pai descobriu que eu cheguei na casa da minha tia com os produtos e com o dinheiro.
Me puxou calado pra fora da casa, e lá perto do portão me deu uns belos de uns sopapos e me repreendeu, dizendo que aquilo não era correto, mandou eu subir a ladeira de volta com o dinheiro e pagar ao caixa da padaria. Dito e feito.
Acho que aquela foi minha primeira lição de moralidade e também meus primeiros safanões que ganhei do meu pai, que foram muito poucos por falta de necessidade.
Eu cresci mais um pouco, fui pra faculdade, morar sozinho no Rio de Janeiro, lá perdi minha namorada (ex Graças a Deus), sofri muito, quis voltar pra casa, coisa de coração bobo, meu pai me ligou depois que minha mãe entregou minha recaída, me chamando de viado, que chorar por causa de namorada era coisa de bichinha, calei meu pai com apenas uma frase:
"PAI, SE EU FOSSE VIADO, EU NÃO ESTARIA CHORANDO POR CAUSA DE UMA MULHER!"
Ele entendeu perfeitamente o recado.
Eu e meu pai vivemos assim, ensinando um ao outro, e isso com a pouca convivência que tivemos, mas a ligação entre nós dois era forte, o pouco que pude conviver com ele aprendi muito, principalmente a ser honesto com as pessoas, a ter respeito com os irmãos e os filhos, pois eu enxergava a preocupação e o amor que ele tinha pela família e queria ser igual a ele, apesar de não aceitar a separação, eu compreendi muito bem o quanto ele precisava sair de casa para encontrar uma paz de um lado e a tristeza de se ver longe dos filhos de outro.
Eu nunca fiz nada escondido do meu pai, pois eu tinha nele um professor, um mestre, um amigo, era com ele que eu contava quando passava por uma situação difícil, quando eu chorava e quando eu ria, eu queria dividir tudo com ele, eu nunca tirei um centavo do meu pai para fazer qualquer coisa sem a sua autorização, isso era a honestidade e o respeito que ele plantou em mim ao longo da minha vida.
Hoje, com meu pai ausente já há 13 anos, vivo situações difíceis sem ele, parece que meu pai não ensinou tão bem as lições dele para outros que deveriam entender que nós somos sua família, somos seu sangue, é triste ver que meu pai deixou escapar lições de honestidade, respeito e amor com os irmãos e mãe numa pessoa que deveria saber isso sem lição nenhuma.
Tristeza me dá de ouvir que eu mereço umas porradas, coisa que meu pai nunca me disse, mas me ensinou muito quando eu precisava me defender, mas essa pessoa não precisa se defender de nada, nem me atacar.
Eu tive desejo de ir embora, porque me corrói por dentro saber que meu sangue, anda contra nós, anda na maré contrária do barco que meu pai nos levou para pescar, infelizmente, percebo que algo de errado aconteceu no processo de lições que meu pai deixou, talvez ele tenha errado, talvez ele tenha percebido mas jamais acreditado que isso iria acontecer, mas hoje, onde quer que ele esteja, ele não está nada feliz com o que está vendo.
De um lado, eu tenho a satisfação de saber que eu estou cumprindo muito bem a lição que meu pai deixou, diferente de muitos pais, que ensinam aos filhos que eles devem ser espertos e levar vantagem em tudo e sobre todos, eu aprendi com o amor que meu pai me ensinou, que mais importante que um bem, móvel ou imóvel, e tantas outras poucas coisas, o maior valor que existe é o amor pelos nossos queridos familiares, e isso, para mim é prioridade, é a lição número 1 que tenho guardada do meu pai, porque eu amei meu pai e tenho certeza que ele me amou, a semente que ele plantou em mim, brotou e floresceu, mas nem todo jardim tem a sorte de receber as sementes do bem, alguns recebem rosas mas preferem cultivar os espinhos, eu recebi flores e todos os dias ofereço-as à minha mãe e à minha irmã.
Eu acreditava e torcia para que meu pai me deixasse outro pai ... mas infelizmente ele não aprendeu tudo que deveria, esqueceu as lições e hoje tem outros métodos para sua vida.
Eu ainda não sou pai, e nem sei se serei, mas louvo a Deus por ter tido um pai que tenha me deixado preparado para ensinar tudo que ele me deixou.
A lição de amor que eu recebi é a lição de amor que vou levar para os meus amigos e familiares, assim como meu pai me ensinou.
O dinheiro não compra a felicidade e nem um lugar no céu! Mais uma lição para não esquecer!