terça-feira, 12 de janeiro de 2010

A VIDA SOB O FOCO DO PRAZER

Uma visão do Mundo de hoje nas palavras de um líder respeitado em todo Brasil:

Uma das principais características do mundo contemporâneo é a busca do prazer. As pessoas não são mais afeitas aos sacrifícios do passado, às demoras de outros tempos. Cada vez mais socializam-se entre nós as oportunidades que nos prometem resultados rápidos, sem muitos esforços. O tempo de demoras já se foi.

Comida rápida, serviços rápidos, porque a vida não pode nos esperar. É o pragmatismo tomando conta de nosso jeito de ver, viver e de ser no mundo. Falaremos mais detalhadamente sobre isso mais à frente.

Os programas de televisão anunciam, o tempo todo, as novidades do mercado. Aparelhos que prometem emagrecer os gordos sem que eles saiam do sofá. Cápsulas que capturam as gorduras dos alimentos antes de elas serem absorvidas pelo organismo. Injeções milagrosas que fazem crescer músculos em corpos magros. Cirurgias que retiram as gorduras — ainda que ofereçam riscos — realizadas em clínicas que não oferecem a menor condição de segurança ao "impaciente" que procura por elas. Enfim, uma infinidade de promessas mágicas.

A literatura das bancas também se ocupa desses milagres. Livros que prometem receitas de felicidade, mesmo que os autores andem sempre mal-humorados. Guias que ensinam a influenciar pessoas, ganhar dinheiro, ficar milionário da noite para o dia.

Neste mundo de tantas pressas, não há espaço reservado para o discurso que exige calma e tranquilidade para ser entendido. Entrevistas fúteis ocupam nossas tardes de domingo. Celebridades sem nenhuma opinião formada aparecem nas telas em rede nacional para repetir seus discursos tolos sobre questões tão sérias. Gente que posa nua nas revistas e se torna referência para nossos filhos. Somos obrigados a suportar os canais abertos de televisão com sua programação artificial, suas videntes tão cegas para as reais necessidades do nosso povo. Um povo que precisa de eu li ura, informação e entretenimento de qualidade. Um povo que passa a gostar do tosco, porque só isso lhe é oferecido.

Cantores que nunca aprenderam a cantar repetem, no programa de grande audiência, versinhos que ferem a inteligência e o bom gosto de uma nação que não sabe mudar de canal, porque descobriu nisso alguma forma de prazer. Enquanto isso, nossos reais valores, compositores de altíssimo nível, cantores e cantoras de excelente nível técnico e artístico se tornam atração para poucos, porque a grande massa nem sabe que eles existem.

Este é o paralelo entre o desejo e o prazer. O desejo é mais profundo que o prazer. Ele precisa de tempo para ser despertado e vivido. O prazer não. E produto rápido. E igual carboidrato de absorção rápida, que não leva tempo para ser assimilado pelo organismo. Desejo é alimento integral, demora para fazer digestão, e por isso alimenta por mais tempo.

O prazer é poço sem fundo. E círculo vicioso. Cria dependência que nos faz procurar por ele o tempo todo. O desejo, ao contrário, cria permanência, porque acalma. Sabemos onde ele fica. Ele movimenta para novas buscas, mas não desorienta. É alimento integral, enquanto o prazer é alimento refinado.

As sociedades estão cada vez mais consumindo os produtos refinados. Eles não exigem muito do organismo. Os produtos integrais, por serem mais substanciosos, exigem o dobro. E como não estamos dispostos a muito esforço, optamos pelo caminho mais simples.

Essa é regra que tem prevalecido. Nada pode nos privar do prazer. Sacrifícios não serão bem-vindos nos nossos tempos. As pessoas se esmeram por buscar os atalhos, porque não há disposição para trilhar a estrada mais longa, ainda que ela seja repleta de belezas e surpresas.

É muito comum encontrar entre alunos que se preparam para o vestibular os resumos das obras que serão abordadas nas provas de literatura. Para que ler a obra completa se podemos ler só o resumo? Essa é a pergunta prática que geralmente é formulada por quem ainda não sabe desejar. Literatura, antes de combinar com o prazer, combina com o desejo. Prazer é consequência do desejo que vem antes.

Estudar nem sempre é atividade prazerosa, mas o que nos mantém na disciplina dos estudos é o desejo de sermos alguém um dia, de termos uma profissão. Ê o desejo de conhecer, desvendar o mundo e reconstruí-lo por meio de uma atuação responsável na sociedade. O desejo é mais profundo, pertence ao mundo dos significados, das realidades que são definitivas. O prazer é mais raso, transitório, e por isso é tão pouco realizador.

O bom é conjugar os dois. Desejo e prazer. O interessante é não perder de vista nenhuma das duas realidades, lutando cons-tantemente para manter acesa a chama do desejo pela vida e pelas pessoas que amamos. O desejo mantém a dinâmica da conquista. Já dizíamos anteriormente que somos território que precisa ser conquistado o tempo todo. Já estamos entregues a nós mesmos, mas ainda precisamos tomar posse. É o desejo de ir sempre além, de não perder o fio da vida, o visgo, o significado.

Prazeres temporários não podem ser definitivos para nós. Se eles passaram, é necessário prender-se no desejo. Outros prazeres virão. É um processo natural. Prazeres não nasceram para serem definitivos, mas o desejo sim. Isso é fundamental para a qualidade de nossa existência. O importante é que a gente não coloque os praxe ivs acima dos desejos.

É interessante, instigante, mas existem pessoas lindas que só conseguem ser objetos de prazer, nunca foco de desejo. As pessoas passam por elas, porém não permanecem. E a prova de que o prazer não é o suficiente para o outro querer ficar. O que nos faz apaixonar uns pelos outros é o desejo que somos capazes de despertar.

Corpos perfeitos despertam prazeres, mas nem sempre despertam desejos. O desejo é que nos faz respeitar a sacralidade que há no outro. O prazer é um impulso rápido. Já o desejo é um impulso de demoras. É feito de vagarczas. Assim como ter que andar mil quilómetros, mas certos de que há um lugar a se chegar. A dureza da viagem e o cansaço serão sempre vencidos cada vez que o desejo for relembrado. Não haverá prazer durante todo o trajeto. Por vezes, os limites serão aflorados, mas o desejo de chegar nos manterá firmes.

Cada vez que identificamos nossa incapacidade de manter acesa a chama dos nossos desejos, e percebemos que somos afeitos à manutenção de prazeres transitórios, revela-se diante de nossos olhos a oportunidade de romper com mais essa forma de sequestro da subjetividade, tão comum nos nossos dias.

A mentalidade que apregoa a vida fácil, sem esforço e sem luta, é instrumento de manutenção social de pessoas apáticas e sem poder de transformação. Há uma constante socialização da ideia de que o sacrifício não deve mais fazer parte da vida humana, e que a felicidade consiste em suprimir qualquer realidade que possa nos desmstalar ou provocar sofrimento.

Dessa perspectiva, o que resta é a infantilização cada vez mais frequente das pessoas; o não amadurecimento, o prolongamento da adolescência e a incapacidade de viver o segundo pilar do conceito de pessoa: a disponibilidade de o outro. Vida sem sacrifício é vida anestesiada, irreal, fortemente marcada pelas estruturas romanceadas dos contos de fadas e pela visão mágica da realidade. Estamos diante das consequências do "mito do amor romântico".

Do Livro: Quem me roubou de Mim? Do Pe. Fábio de Melo